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Como dar a notícia da gravidez no trabalho – inclusive se você é a chefe

Quando é a hora de contar no trabalho que você está grávida? E se, de repente, for a minha vez na lista de adoção? Para quem contar primeiro? Conversamos com especialistas para responder dúvidas sobre o assunto – e a real é que, sim, a maternidade ainda é tabu no ambiente profissional e precisamos falar sobre isso.

Tudo começa muito antes das futuras consultas pediátricas, com os exames de pré-natal e com a licença-maternidade. Prevista na lei trabalhista brasileira, ela ainda pode ser encarada de forma negativa no mercado de trabalho. E você, gestando, já pode sentir isso.

O medo de ser discriminada existe – para umas percebido com muita clareza, para outras como um borrão no meio de todas as sensações. A discriminação, infelizmente, pode existir, por isso, o ideal é estar preparada e lidar com a sua realidade da forma mais consciente possível, começando pelo momento de dar a notícia.

“Precisa ser cuidado e planejado, essa é a nossa recomendação. A primeira coisa que a gente sugere é que se planeje o momento adequado, um espaço onde haja liberdade para conversar”, Michelle Terni, CEO da consultoria Filhos no Currículo.

O recomendado é que a primeira conversa seja com a sua liderança direta, ou seja, com a sua ou o seu chefe. Resistir à vontade de compartilhar com colegas mais chegados é o melhor caminho, para evitar que a notícia se espalhe sem uma estratégia e o devido cuidado.

Está em dúvida se conta após as 12 primeiras semanas ou se já conta antes? Tudo depende de você e de como ou onde você realiza seu trabalho. “O que a gente costuma dizer em nossos treinamentos é que não existe regra, é uma decisão muito pessoal, mas é preciso que haja uma reflexão sobre os impactos dessa espera. Tem pessoas que trabalham em espaços que se tornam insalubres para grávidas ou em atividades que envolvem carregar peso, por exemplo”, explica Michele Terni, especialista em equidade de gênero, CEO e co-fundadora da consultoria Filhos no Currículo.

Se um desses for o seu caso, quanto antes contar melhor, afinal se houver alguma adequação que precise ser feita na sua rotina profissional, isso terá que ser conversado com a sua liderança.

Estou para ser promovida, espero para contar da gestação?
Um receio comum é de contar da gestação quando está prestes a ser promovida ou mudar de cargo. “As vezes a pessoa é promovida e se sente em dívida com a empresa. Mas em uma cultura acolhedora, que é onde a gente quer chegar, o ideal é que você possa dar a notícia com tranquilidade, sua capacidade profissional segue. Inclusive, os exemplos que temos visto foram de mulheres acolhidas nesse momento de promoção, com chefe dizendo ‘a gente continua querendo você e te espera'”, conta Michelle.

A especialista ressalta que, quando existe, o acolhimento acaba trazendo bons resultados para a empresa, porque essas mães voltam da licença muito mais potentes e leais ao trabalho.

Rita Monte é terapeuta somática, fundadora da Escola de Mulheres Criadoras, especialista em lideranças femininas, maternidade, paternidade e carreira, e explica: se a gestante já tiver recebido a promoção ou em vias de receber, legalmente nada pode mudar. Mas lembra que, na prática, tudo pode acontecer, dependendo da cultura organizacional.

Se o ambiente que essa mulher trabalha já é mais tóxico, é bem possível que ela precise esperar ser promovida para dar a notícia da gravidez. Caso contrário, ela pode ser preterida. Ela precisa ficar muito atenta ao ambiente em que está, para jogar o jogo conforme as regras do lugar.
Rita Monte, terapeuta somática

Se você já foi promovida e precisa dar a notícia da espera de uma criança (inclusive por adoção), a dica é entender como se sente assegurada quanto aos benefícios do novo posto e da licença maternidade. E também buscar entender como é a questão da licença paternidade na empresa do seu par, caso tenha um. “De novo, legalmente, essa gestante não pode ser discriminada e perder o cargo, mas muitos absurdos acontecem”, lembra Rita.

E muda algo em caso de adoção?
O que fazer se a parentalidade for adotiva? A mesma coisa, embora o cenário seja um pouco diferente. “Quando a gente tem uma situação de adoção , muitas vezes a notícia da chegada de uma criança vem com menos planejamento? Você pode estar numa fila de espera e seu telefone tocar porque está na hora de buscar seu filho”, exemplifica Michelle.

Algumas famílias resolvem contar no começo do processo de habilitação no processo adotivo, outras esperam a confirmação de que estão realmente na lista oficial de espera – que pode ser longa ou não. De novo, não existe regra.

Do lado da liderança, é essencial ter uma clareza muito grande para pensar em um plano rápido para substituição da colaboradora no período de licença. Você, colaboradora, pode tentar ajudar, claro.

E se você é a líder que recebe a notícia?
A recomendação é se preparar para esse momento, mesmo sem saber quando a notícia virá. A palavra-chave é empatia: é fundamental entender que é um momento extremamente sensível para a gestante, demonstrando cuidado e atenção. “Não é hora de sair cobrando ou planejando como tudo vai acontecer. Muitas vezes, a gestante vem carregada de muitas angústias e ela quer e precisa de acolhimento. Liderança é acolhimento”, orienta também Michelle Terni.

As lideranças precisam conhecer os benefícios que a empresa oferece para figuras parentais, informar sobre as políticas existentes, e definir – junto com a gestante – sobre quando e de que forma compartilhar a notícia com todo o time. Seja você a chefe, ou a gestante liderada, o ideal é conversar sobre detalhes que podem passar despercebidos, como os melhores horários para agendamentos de consultas do pré-natal.

E se você é líder e está grávida?
Para quem é chefe e vive a experiência da maternidade, é interessante perceber que existe uma camada a mais, que é o exemplo. “O quanto você e suas atitudes enquanto líder à espera de uma criança também comunica, autoriza ou desautoriza seu time a viver a parentalidade? É importante que a chefe gestante não negligencie a própria parentalidade, porque isso acaba autorizando outras pessoas a fazer o mesmo”, diz Michelle.

É uma ótima maneira de contribuir para que mais mulheres possam se tornar mães sem medo de perder lugar no mercado de trabalho. “Ela pode começar a fazer diferente do que ela viu nos modelos femininos de liderança, pois poucos são os de mulheres que valorizam a gestação e a maternidade, e que não têm medo do que pode acontecer com elas. É uma chance de cultivar um ambiente com a equipe que seja respeitoso e favorável a essas mudanças que vão acontecer com qualquer um com chegada de uma criança”, complementa Rita Monte.

É preciso sim comunicar ao seu time, mas – de novo – no momento que julgar interessante. Assim como organizar sua saída temporária, criando uma relação de confiança acima de tudo, com os seus liderados e com quem ficará no seu lugar, se essa pessoa existir.

E se você é empreendedora?
Obviamente que, se você é empreendedora, autônoma ou possui um modelo de trabalho como pessoa jurídica, tudo pode ser mais complexo. Mas também pode ser menos! Isso porque, na teoria, profissionais assim deveriam ter mais controle sobre sua própria agenda, tendo mais flexibilidade, fazendo com que seja possível que filhos e carreira caminhem lado a lado (ainda que seja tão desafiador quanto em um modelo CLT). Não se esqueça, porém, que alguns benefícios não fazem parte da sua realidade, como licença maternidade estendida ou até mesmo a licença de quatro meses remunerada. “Nós somos uma empresa de pequeno porte, estou gestando e vivo esse dilema”, conta Michele, que já é mãe do Thomas e do Alex e co-fundadora da Filhos no Currículo.

A especialista em maternidade e carreira Rita Monte dá a dica: além de pensar no momento certo de contar para sua equipe, é preciso, antes de mais nada, ter uma gestão financeira para poder usufruir de uma licença por pelo menos 3 meses. Planeje-se, e se informe: se é microempreendedora individual (MEI) e paga suas taxas corretamente por pelo menos 10 meses antes da data do parto, você tem direito à licença sim. Se possui algum outro tipo de empresa, converse com seu contador, para garantir que está recolhendo o INSS e veja quais opções tem, para se afastar e retornar ao trabalho com tranquilidade.

E em caso de perda?
Em caso de perda gestacional, que pode acontecer com qualquer mulher e requer acolhimento no ambiente de trabalho, é um puerpério a ser vivido. Existiram muitas expectativas construídas e esse é também um tema tabu, que precisa ser conversado, e respeitado. Por lei, inclusive, a mulher terá um repouso remunerado de trinta dias, ficando-lhe assegurado o direito de retornar à função que ocupava antes de seu afastamento.

Fonte: Universa/UOL