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Danos morais coletivos: Produtor de café pagará R$ 300 mil por trabalho escravo

Relator destacou a gravidade das condições de trabalho e a necessidade de medidas para coibir a repetição dessas práticas.

A Justiça do Trabalho de Minas Gerais condenou o proprietário da Fazenda Nossa Senhora da Guia, localizada em Ilicínea/MG, ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 300 mil, por submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão. No julgamento realizado pela 11ª turma do TRT da 3ª região, o relator do caso, desembargador Antônio Gomes de Vasconcelos, destacou a gravidade das condições de trabalho e a necessidade de medidas para prevenir a repetição dessas práticas.

De acordo com os relatórios de fiscalização, os trabalhadores da fazenda foram encontrados em situação de extrema precariedade. Eles não tinham carteira de trabalho assinada, eram obrigados a comprar seus próprios equipamentos de proteção e a pagar pela alimentação, que era descontada dos seus salários. “Tudo o que nós compravávamos era descontado, inclusive luvas e panos de colheita utilizados”, declarou um dos trabalhadores, ouvido como testemunha.

Além disso, estavam alojados em locais inadequados e trabalhavam de domingo a domingo, das 6h às 18h, sem direito a descanso. Inclusive, na véspera da fiscalização, um dos trabalhadores havia sofrido um grave acidente, já que ele não estava habilitado para conduzir um trator.

O MPT ajuizou a ação civil pública após uma fiscalização constatar as condições degradantes. O MPT argumentou que as práticas na fazenda configuravam trabalho escravo, citando a falta de registro dos trabalhadores, as condições de alojamento insalubres, as jornadas exaustivas, entre outras irregularidades.

O proprietário da fazenda de café alegou que as condições de trabalho não eram degradantes e que os trabalhadores estavam livres para sair quando quisessem. Em depoimento, o fazendeiro comparou o alojamento precário dos trabalhadores com “hotéis e pousadas do litoral, onde os veranistas, quando são em grande número, dormem em colchonetes e sacos de dormir”. Ele também questionou a legitimidade do MPT para mover a ação e afirmou que os depoimentos dos trabalhadores eram inconsistentes.

Decisão da Justiça

Na decisão de primeiro grau, o juízo da 1ª vara do Trabalho de Varginha/MG reconheceu as condições precárias de trabalho, determinando a regularização da situação dos trabalhadores, a fixação de multas diárias e o pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 50 mil. As obrigações de fazer determinadas na sentença incluem proporcionar capacitação aos trabalhadores para manuseio e operação segura de máquinas, equipamentos ou implementos.

Em grau de recurso, o relator rejeitou as alegações do fazendeiro em seu voto condutor. Ele realizou um exame detalhado das provas produzidas no processo. Entre as provas, estavam depoimentos de trabalhadores colhidos durante a fiscalização e em processos conexos. Destacaram-se os depoimentos nos autos do processo nº 0011321-14.2022.5.03.0079, que foram utilizados como prova emprestada. Ele frisou que as provas apresentadas pelo MPT, incluindo depoimentos de trabalhadores e o relatório de fiscalização, eram suficientes para confirmar a existência de condições análogas à escravidão.

“Os trabalhadores estavam submetidos a condições degradantes, sem equipamentos de proteção, alojados em locais inadequados e sem registro formal”, pontuou o relator. “Para a caracterização do trabalho em condição análoga à de escravo, nos termos do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se comprove cerceio da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima ‘a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, ‘a condições degradantes de trabalho’. Consigne-se que o caput da norma enumera diversas condutas, de modo que basta uma delas e não a combinação de todas para a configuração do tipo penal”, completou.

Multas e indenizações

Em decisão unânime, os julgadores do TRT-3 confirmaram a decisão de primeiro grau, apenas aumentando o valor da indenização por danos morais coletivos de R$ 50 mil para R$ 300 mil, quantia a ser revertida a entidade pública ou privada idônea sem fins lucrativos.

Além disso, foram impostas multas diárias para assegurar a regularização das condições de trabalho na fazenda. As multas aplicadas foram significativas, com valores de R$ 30 mil por descumprimento de cada obrigação de fazer e não fazer, além de R$ 1 mil por trabalhador prejudicado.

As obrigações impostas, acrescentadas pelo relator, incluem evitar a manutenção de empregado trabalhando sob condições contrárias às disposições de proteção do trabalho, quer seja submetido a regime de trabalho forçado, quer seja reduzido à condição análoga à de escravo. O fazendeiro deverá também conceder aos empregados o repouso semanal remunerado de 24 horas seguidas, de preferência aos domingos. De acordo com a decisão, o fazendeiro deverá projetar, construir, operar e manter todas as partes das instalações elétricas de maneira a prevenir, por meios seguros, os perigos de choque elétrico e outros tipos de acidentes.

Processo: 0010558-48.2023.5.03.0153

Fonte: Redação do Migalhas